A Academia Sul-Mato-Grossense de Letras (ASL) ofereceu na noite de quinta-feira passada (28/03) mais um chá acadêmico sobre episódios e abordagens histórico-culturais do País. Na sede da entidade, o professor Arno Wehling, titular da cadeira Nº 37 da Academia Brasileira de Letras (ABL), discorreu sobre o instigante tema “Um idealismo constitucional?”, dentro da série “ABL-ASL Palestras Imortais”, com o apoio da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul (FCMS).
No Bicentenário da Constituição de 1824, o apelo temático remete a uma das quadras históricas mais importantes do Brasil, cujos impactos se espraiaram pelas instituições, costumes e diferentes regiões, salientou o presidente da ASL, Henrique de Medeiros. “É uma iniciativa que une a ABL, a ASL e o governo na perspectiva de difundir, valorizar e estimular a leitura e os conhecimentos”, afirmou.
Eleito imortal pela ABL em 2017, o professor, historiador e ensaísta Arno Wehling é graduado pela Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil e em Direito pela Universidade Santa Úrsula, tendo doutorado em História e Livre Docência em História Ibérica, ambos pela Universidade de São Paulo e pós-doutorado pela Universidade do Porto. Ocupa na ABL e cadeira que foi do poeta Ferreira Gullar. É autor de diversos trabalhos sobre as relações entre a filosofia da ciência e o conhecimento histórico.
FLUÊNCIA – Com participação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e da Confraria Sociartista, as introduções da cerimônia foram feitas pelo secretário-geral da ASL, Rubenio Marcelo, e os acadêmicos sul-mato-grossenses aplaudiram o passeio fluente e objetivo da palestra, destacando o olhar aguçado e crítico de Wehling para as raízes e as consequências dos processos políticos, culturais, econômicos e sociais que estão alojados no ventre da história constitucional. O palestrante, por sua vez, enalteceu a iniciativa:
“Trata-se de um evento muito positivo. As Academias Estaduais de Letras são importantes para aprimorar o conhecimento, incentivar o acesso da sociedade e realizar, de maneira articulada, o contato cujo significado é relevante no plano cultural, tanto nacional como local”, disse. Para ele, além das características tradicionais, as Academias avivam o apelo por maior interação com a comunidade.
“É indispensável. Primeiro, pelo estágio de desenvolvimento histórico do País. Não se deve perder a oportunidade de uma maior e mais ampla integração do processo cultural dentro da sociedade, seus segmentos e suas regiões”, analisou. “O Brasil tem uma grande continentalidade geográfica e cultural, são amplas diversidades regionais. E as Academias Estaduais podem colaborar, pela experiência dos acadêmicos, pelas histórias de vida, no enriquecimento e na disseminação destes conhecimentos”, pontuou.
ACESSIBILIDADE – Wehling reiterou a expectativa de ver, em uma escala crescente, as Academias de Letras cada vez mais acessíveis ao povo, garantindo a presença de cultura e informação nos vários ambientes. Ele observou que este objetivo vem sendo construído pontualmente, como demonstram as escolas e universidades. “É algo que varia de estado para estado, de escola para escola. Mas temos um trabalho feito pelo MEC – Ministério da Educação, há bastante tempo, procurando a disponibilizar, a preço baixo, obras e livros de diferentes áreas”.
O acadêmico enfatizou um aspecto específico que chama sua atenção: a falta de antologias literárias. “A minha geração talvez tenha sido a última a estudar no atual secundário, curso clássico, pela Antologia Nacional, de Fausto Barreto e Carlos de Laet, nos anos 1960”, exemplificou. A seu ver, estes recortes com explicações correlatas, literatura gramatical e abordagens históricas, entre outros itens, são muito importantes para dar ao estudante a panorâmica geral, e a partir daí ele desenvolve o tipo de leitura que prefere. “O ideal é ter uma panorâmica que lhe permita fazer uma aferição do gosto literário”, define.
Sobre causas e consequências da crise que afeta a produção literária impressa e a atividade comercial das publicações, Wehling foi incisivo: “O fechamento de grandes livrarias e a redução da produção impressa de livros passam pelo lado econômico. O livro ainda é produto caro para a capacidade aquisitiva de boa parte da população”, acentuou.
Wehling supõe que livrarias menores, às vezes especializadas, talvez pudessem atender melhor determinados públicos. “Com as possibilidades da informática talvez isto seja superado. Hoje um e-book é mais barato que um livro físico. Temos a dificuldade econômica, temos o analfabetismo funcional – como os pesquisadores educacionais chamam – e problemas estruturais”, concluiu.